terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Henri Wallon


Biografia de Henri Wallon
- Henri Paul Hyacinthe Wallon.
- Nasceu em 15 de junho de 1879 em Paris (França).
- Tornou-se conhecido por seu trabalho científico sobre Psicologia do Desenvolvimento, devotado principalmente à infância, em que assume uma postura notadamente interacionista, e por sua atenção política e posicionamento marxista.
- Integrou a vida científica à ação social, numa atitude de coerência e engajamento. Viveu em um período marcado por muita instabilidade social e turbulência política ( 1ª Guerra Mundial – 1014/1918 e 2ª Guerra Mundial – 1939/1945). Para Wallon ficou muito evidente a influência fundamental que o meio social exerce sobre o desenvolvimento da pessoa humana. Esta influência recebeu lugar de destaque em sua teoria.
- 1902 (aos 23 anos de idade) formou-se em Filosofia. Como professor discordava dos autoritários métodos empregados para controle disciplinar.
- 1908 formou-se em Medicina. Entre 1908 a 1931 trabalhou com crianças portadoras de deficiência mental.
- 1909 publicou o 1º trabalho: “Delírio de Perseguição. O Delírio Crônico na Base da Interpretação”.
- 1925 :Tese de Doutorado “A Criança Turbulenta”, iniciando um período de intensa produção literária na área da Psicologia da Criança.
- 2ª Guerra Mundial – 1939/1945 foi perseguido pela Gestapo, tendo que viver na clandestinidade.
- 1935: visitou o Brasil.
- 1962 : faleceu em 01 de dezembro de 1962, aos 83 anos, em seu país de origem.

Posições Teóricas de Henri Wallon

- O processo de aprendizagem é dialético: não é adequado postular verdades absolutas, mas, sim, revitalizar direções e possibilidades.
- Admite o organismo como condição primeira do pensamento, afinal toda função psíquica supõe um equipamento orgânico. Adverte, contudo, que não lhe constitui uma razão suficiente, já que o objeto da ação mental vem do exterior, isto é, do grupo ou ambiente no qual o indivíduo se insere. Entre os fatores da natureza orgânica e os da natureza social as fronteiras são tênues, é uma complexa relação de determinação recíproca. O homem é determinado fisiológica e socialmente, sujeito, portanto, a uma dupla histórica, a de suas disposições internas e a das situações exteriores que encontra ao longo de sua existência.
- A gênese da inteligência para Wallon é genética e organicamente social.
- Critica as concepções reducionistas que limitam a compreensão do psiquismo humano a um ou a outro termo da dualidade espírito-matéria. A teoria do desenvolvimento cognitivo de Wallon é centrada na psicogênese da pessoa completa, tanto em relação a seu caráter cognitivo quanto ao caráter afetivo e motor. Para ele, a cognição é importante, mas não mais importante que a afetividade ou a motricidade. Wallon recusa-se a selecionar um único aspecto do ser humano e isolá-lo do conjunto. Propõe o estudo integrado do desenvolvimento, ou seja, que este abrarque todos os campos funcionais nos quais se distribui as atividades infantis (afetividade, motricidade e inteligência).
- A existência do homem, ser indissociavelmente biológico e social, se dá entre as exigências do organismo e as da sociedade, entre os mundos contraditórios da matéria viva e da consciência. O estudo do psiquismo não deve, portanto, desconsiderar nenhum desses fatores, em tampouco tratá-los como termos independentes; deve ser situado entre o campo das ciências naturais e sociais.
- Ao contrário à visão localizacionista Wallon defendia a idéia da plasticidade do sistema nervoso.
- Recorreu a dados provenientes de outros campos de conhecimento como Neurologia, Psicopatologia, Antropologia e a Psicologia Animal.
- Devido à adequação às características do seu objeto, Wallon adota o Materialismo Dialético como método de análise e fundamento epistemológico de sua teoria psicológica, uma psicologia dialética.
- O desenvolvimento tem uma dinâmica e um ritmo próprio, resultantes da atuação de princípios funcionais que são:
a) Fatores Orgânicos - responsáveis pela sequência que se verifica entre os estágios do desenvolvimento. Podem tem seus efeitos transformados pelas circunstâncias sociais.
b) Fatores Sociais - a influência do meio social torna-se decisiva na aquisição de condutas psicológicas superiores, como a inteligência simbólica. É a cultura e a linguagem que fornecem ao pensamento os instrumentos para sua evolução.
- A passagem de um estágio ao outro não é uma simples ampliação (não é linear, por ampliação), mas uma reformulação. Com frequência instala-se, nos momentos de passagem, uma crise que pode afetar visivelmente a conduta da criança.
- O desenvolvimento infantil é um processo pontuado por conflitos, sejam eles exógenos (externos) ou endógenos (internos). Isto desorganiza, conturba, desequilibra as formas de conduta que já tinham atingido certa estabilidade na relação do sujeito com o meio. Wallon vê os conflitos como propulsores do desenvolvimento.
- A descrição que Wallon faz dos estágios é descontinua e assistemática. Este autor elege um tipo de atividade como foco principal e procede mostrando suas características em diferentes idades e delineando suas relações com outros tipos de atividades.
- O desenvolvimento da pessoa é uma construção progressiva em que se sucedem fases como predominância alternadamente afetiva e cognitiva. Frequentemente, os períodos predominantemente afetivos ocorrem em fases focadas na construção do EU , enquanto que estágios com predominância cognitiva estão mais direcionados à construção do REAL e compreensão do mundo físico.
Para uma compreensão mais concreta dessa idéia, a Psicogenética Walloniana apresenta uma descrição das características centrais de cada um dos cinco estágios do desenvolvimento humano:
a) Estágio Impulsivo-emocional: presente desde o nascimento até aproximadamente o primeiro ano de vida. É um estágio predominantemente afetivo, no qual as emoções são o principal instrumento de interação com o meio. Consiste na preparação das condições sensório-motoras. O movimento, como campo funcional, ainda não está desenvolvido. Até então os movimentos infantis são um tanto desordenados, mas a contínua respostas do ambiente a este movimento permite que a criança passe da desordem gestual às emoções diferenciadas.
b) Estágio Sensório-motor e Projetivo: presente dos três meses de idade até aproximadamente o terceiro ano de vida. Ao contrário do estágio anterior, neste predominam as relações cognitivas com o meio (inteligência prática-simbólica). Os pensamentos, neste estágio, muito comumente se projetam em atos motores.
INTELIGÊNCIA: Inteligência Prática (obtida pela interação de objetos com o próprio corpo).
Inteligência Discursiva (adquirida pela imitação e apropriação da linguagem).
c) Estágio do Personalismo: compreende a faixa etária dos três aos seis anos. A tarefa central é o processo de formação da personalidade e da auto-consciência, definindo o retorno da predominância das relações afetivas. Uma consequência do caráter auto-afirmativo deste estágio é a crise negativista ( a criança opõe-se sistematicamente ao adulto). Observa-se também uma fase de imitação motora e social.
d) Estágio Categorial: inicia-se aos seis anos e vai até aproximadamente até os onze anos de idade .Traz importantes avanços no plano da inteligência, imprimindo às relações com o meio preponderância do aspecto cognitivo. É o período de acentuada predominância da inteligência sobre as emoções. Aqui a criança desenvolve as capacidades de memória e atenção voluntárias.
Formam-se as Categorias Mentais : conceitos abstratos que abarcam vários conceitos concretos sem se prender a nenhum deles.
No Estágio Categorial o poder de abstração da mente da criança é consideravelmente ampliado e, provavelmente por este fato, o raciocínio simbólico se consolida como ferramenta cognitiva.
e) Estágio da Adolescência: aproximadamente aos 11\ 12 anos, o sujeito começa a passar por transformações físicas e psicológicas da adolescência. Este é um estágio predominantemente afetivo, durante o qual o sujeito vivencia uma série de conflitos internos e externos. Os grandes marcos deste são a busca de auto-afirmação e o desenvolvimento da sexualidade (questões pessoais, morais e existenciais são trazidas à tona).
- O predomínio do caráter intelectual corresponde às etapas em que a ênfase está na elaboração do real e no conhecimento do mundo físico. A dominância do caráter afetivo corresponde às etapas que se prestam à construção do real.
- Os estágios de desenvolvimento não se encerram com a adolescência. O processo da aprendizagem sempre implica na passagem para um novo estágio. O processo dialético de desenvolvimento jamais se encerra, pois a emoção sobrepõe-se à razão quando o sujeito se depara com o desconhecido. Desta forma, afetividade e emoção não são estanques e se revelam na dominância dos estágios.
- Princípio da Alternância Funcional: Cada nova fase inverte a orientação da atividade e do interesse do sujeito: do EU para o MUNDO, das PESSOAS para as COISAS. Apenas por alterarem a dominância, efetividade e cognição não se mantêm como funções exteriores uma a outra. Cada uma, ao aparecer como atividade predominante em um estágio, incorpora as conquistas realizadas pela outra.
- Princípio da Integração Funcional: É o princípio que explica a construção recíproca entre a afetividade e a cognição. Este princípio e extraído do processo de maturação do sistema nervoso, no qual as funções mais evoluídas, de amadurecimento mais recente, não suprimem as mais arcaicas/antigas, mas exercem sobre estas o controle.

O Desenvolvimento Infantil

- É possível identificar em cada etapa da vida de uma pessoa características distintas (necessidades e interesses). A cada idade estabelece-se um tipo de interação entre a criança e o meio. Conforme as características de cada idade a criança interage mais com um ou outro fator.( ambiente físico, pessoas próximas, linguagem, conhecimentos culturais). O meio não é estático e transforma-se juntamente com a criança.
Conflitos EU-OUTRO e a Construção da Pessoa
- O ser humano está alicerçado em algumas atividades cognitivas, isto, em campos que agrupam a diversidade psíquica.
- Campos Funcionais: movimento, afetividade, inteligência e a pessoa.
Estes campos vão se diferenciando ao longo do desenvolvimento da pessoa, tornando-se independentes.
O ser humano é considerado por si só como campo funcional, pois integra todas essas atividades.
A – Movimento
- É considerado um dos primeiros campos a se desenvolver, servindo de base para os s outros campos posteriores.
- As emoções dependem fundamentalmente da organização dos campos para se organizarem. A motricidade, portanto, tem caráter pedagógico tanto pela qualidade do gesto e do movimento quanto por sua representação.
- A escola não deve “imobilizar” a criança em uma carteira, limitando justamente a fluidez das emoções e do pensamento, tão necessária para o desenvolvimento completo da pessoa.
- O desenvolvimento da inteligência depende essencialmente de como cada criança faz as diferenciações com a realidade exterior.
B – Afetividade
- A afetividade é um dos princípios elementos do desenvolvimento humano.
-As transformações fisiológicas de uma criança (transformações em seu sistema neurogevetativo) revelam traços importantes de caráter e personalidade. Segundo Heloysa Dantas (FEUSP) “a emoção é altamente orgânica, altera a respiração, os batimentos cardíacos e até o tônus muscular ; há momentos de tensão e distensão que ajudam o ser humano a se conhecer.”
- A raiva, a alegria, o medo e os sentimentos mais profundos ganham função relevante na relação da criança com o meio. - A emoção causa impacto no outro e tende a se propagar no meio social.
- A afetividade é o fator fundamental nas relações sociais, ponto crucial que separa a criança do ambiente.
C - Inteligência
- A proposta Walloniana propõe o desenvolvimento intelectual dentro de uma cultura mais humanizada.
- Esta abordagem considera a pessoa como um todo. Elementos com afetividade, emoções, movimento e espaço físico se encontram em um mesmo plano.
D - Pessoa
- Este campo está relacionado ao desenvolvimento da consciência e da identidade do EU.
- A construção do EU depende essencialmente do OUTRO, seja para ser referência ou para ser negado.
- Crise de Oposição: momentos em que, a negação do outro, funciona como uma espécie de instrumento de descoberta de si mesmo. Ocorre por volta do 3 anos de idade. Características comuns nesta fase:
Manipulação (agredir ou se jogar no chão para atingir um objetivo).
Sedução (fazer chantagem emocional).
Imitação do outro.
- Também podem ser considerados elementos estimuladores da construção do EU: dor, ódio e sofrimento.

Para Saber +



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Bibliografia
GALVÃO, Izabel. Henri Wallon – Uma concepção dialética do desenvolvimento infantil. Petrópolis, R.J.: Vozes, 1995.

Documentário em  Café Filosófico

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Lev Semenovich Vygotsky

BIOGRAFIA

1896: Nasce Lev Semenovich Vygotsky em 17/11, na Bielarus. Família judia.
1911: Ingressa pela primeira vez em uma instituição escolar, após anos de instrução com tutores particulares.
1913: Forma-se no Curso Secundário. Ingressa na Universidade de Moscou, no curso de Direito.
1914: Frequenta aulas de História e Filosofia.
1917: Forma-se em Direito.
Revolução Russa.
1917 – 1923: Leciona Literatura e Psicologia.
1920: Toma conhecimento que está Tuberculoso.
1924: Conferência no II Congresso de de Psiconeurologia de Leningrado, marco importante em sua carreira profissional. Inicia o trabalho no Instituto de Psicologia de Moscou.
1925: “Psicologia da Arte” – publicado em Moscou em 1965. Viaja para o exterior pela primeira e única vez em sua vida.
Organiza o Laboratório de Psicologia para Crianças Deficientes.
1929 - Instituto de Estudos das Deficiências.
Após 1934 - Instituto Científico de Pesquisa sobre deficiências da Academia de Ciências Pedagógicas.
1943: Morre de tuberculose, em 11/06, aos 37 anos de idade.
1962: Publicação do livro “Pensamento e Linguagem” nos Estados Unidos.
1982- 1984: Edição das obras completas de Vygotsky na URSS.
1984: Publicação da coletânea “A Formação Social da Mente” no Brasil.
1987: Publicação de “Pensamento e Linguagem” no Brasil.
1988: Publicação de “Aprendizagem e Desenvolvimento Intelectual na Idade Escolar” no Brasil.
- Trabalhou também na área chamada Pedologia (Ciência da criança que integra os aspectos biológicos, psicológicos e antropológicos).
- Escreveu aproximadamente 200 trabalhos científicos, cujos temas vão desde a Neuropsicologia até a crítica literária, passando pela deficiência, linguagem, psicologia, educação e questões teóricas e metodológicas relativas às ciências humanas.

PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

- Vygotsky, Luria e Leontiev faziam parte de um grupo de intelectuais da Rússia pós-Revolução que tinha por objetivo a busca do “novo”, de uma ligação entre a produção científica e o regime social recém-implantado.
O grupo buscava a construção de uma “Nova Psicologia”, que consistisse em uma síntese entre as duas fortes tendências presentes na Psicologia do início do século:
- Psicologia como ciência natural.
- Psicologia como ciência mental.
Síntese : Não é a simples soma ou justaposição de dois elementos, mas a emergência e algo novo, anteriormente inexistente.Esse componente novo não estava presente nos elementos iniciais: Foi tornado possível pela interação entre esses elementos.
- Assim, a abordagem que busca uma síntese para a Psicologia integra, numa mesma perspectiva, o homem enquanto corpo e mente, ser biológico e ser social, membro da espécie humana e participante de um processo histórico.
- Essa nova abordagem para a Psicologia fica explícita em três idéias centrais que podemos considerar como os “Pilares” básicos do pensamentos de Vygotsky:
A) As funções psicológicas têm um suporte biológico, pois são produtos da atividade cerebral.
B) O funcionamento psicológico fundamenta-se nas relações sociais entre os indivíduos e o mundo exterior, as quais se desenvolvem num processo histórico.
C) A relação do homem com o mundo é uma relação mediada por sistemas simbólicos.
- A postulação de que o cérebro, como órgão material, é a base biológica do funcionamento psicológico toca um dos extremos da Psicologia: o homem, enquanto espécie biológica, possui uma existência material que define limites e possibilidades para o seu desenvolvimento.
- O cérebro, no entanto, não é um sistema de funções fixas e imutáveis, mas um sistema aberto, de grande plasticidade, cuja estrutura e modos de funcionamento são moldados ao longo da história da espécie e do desenvolvimento individual.
- Dadas as imensas possibilidades de realização humana, essa plasticidade é essencial: o cérebro pode servir a novas funções, criadas na história do homem, sem que sejam necessárias transformações no órgão físico.
- Essa idéia da grande flexibilidade não supõe um caos inicial, mas sim a presença de uma estrutura básica estabelecida ao longo da evolução da espécie, que cada um de seus membros traz consigo ao nascer.
- Outro pressuposto do trabalho de Vygotsky aponta que o homem transforma-se de biológico em sócio-histórico, num processo em que a cultura é parte essencial da constituição da natureza humana.
- O funcionamento psicológico, particularmente no que se refere às Funções Psicológicas Superiores, tipicamente humanas, está baseado fortemente nos modos culturalmente construídos de ordenar o real.
Funções Psicológicas Superiores - mecanismos psicológicos mais sofisticados, mais complexos, que são típicos do ser humano e que envolvem o controle consciente do comportamento, a ação intencional e a liberdade do indivíduo em relação às características do momento e do espaço presentes. Funções Psicológicas Superiores (ou processos mentais superiores): pensar em objetos ausentes, imaginar eventos nunca vividos, planejar ações a serem realizadas.
Mecanismos mais Elementares - Ações Reflexas, Reações Automatizadas ou Processos de Associação Simples entre Eventos.

MEDIAÇÃO SIMBÓLICA

- Um conceito central para compreendermos o fundamento sócio-histórico do funcionamento psicológico é o conceito de MEDIAÇÃO: a relação do homem com o mundo não é uma relação direta, mas uma relação mediada, sendo os sistemas simbólicos os elementos intermediários entre o sujeito e o mundo.
- Esse modo de funcionamento psicológico (Funções Psicológicas Superiores), típico da espécie humana, não está presente no indivíduo desde o nascimento. As atividades psicológicas mais sofisticadas são frutos de um processo de desenvolvimento que envolve a interação do organismo individual com o meio físico e social em que vive. A aquisição da linguagem definirá um salto qualitativo no desenvolvimento do ser humano.
- MEDIAÇÃO: em termos genéricos, é o processo de intervenção de um elemento intermediário em uma relação. A relação deixa, então, de ser direta e passa a ser mediada por esse elemento. A presença de elementos mediadores introduz um elo a mais nas relações entre organismo e meio, tornando-as mais complexas. Ao longo do desenvolvimento do indivíduo as relações mediadas passam a predominar sobre as relações diretas.
- A relação do homem com o mundo não é uma relação direta, mas, fundamentalmente, uma relação mediada. As Funções Psicológicas Superiores apresentam uma estrutura tal que entre o homem e o mundo real existem mediadores, ferramentas auxiliares da atividade humana.
- Vygotsky distinguiu dois tipos de elementos mediadores: os instrumentos e os signos. Embora exista uma analogia entre esses dois tipos de mediadores, eles têm características bastante diferentes e merecem ser tratados separadamente.

O USO DOS INSTRUMENTOS

- A importância dos instrumentos na atividade humana, para Vygotsky, tem ligação com sua filiação teórica aos postulados marxista. Vygotsky busca compreender as características do homem através do estudo da origem e desenvolvimento da espécie humana, tomando o surgimento do trabalho e a formação da sociedade humana, com base no trabalho, como sendo processo básico que vai marcar o homem como espécie diferenciada. É o trabalho que, pela ação transformadora do homem sobre a natureza, une o homem e natureza e cria a cultura e a história humana. No trabalho desenvolvem-se, por um lado, a atividade coletiva e, portanto, as relações sociais, e, por outro lado, a criação e utilização de instrumentos.
- O instrumento, externo ao sujeito, é um elemento interposto entre o trabalhador e o objeto de seu trabalho, ampliando as possibilidades de transformação da natureza. O instrumento é feito ou buscado especialmente para um certo objetivo. Ele carrega consigo, portanto, a função para a qual foi criado e o modo de utilização desenvolvido durante a história do trabalho coletivo. É, pois, um objeto social e mediador da relação entre o indivíduo e o mundo.

O USO DOS SIGNOS

- A invenção e a utilização dos signos como meios auxiliares para solucionar um dado problema psicológico (lembrar ou comprar coisas) é análoga à invenção e uso dos instrumentos, só que agora no campo psicológico. O signo age como um instrumento da atividade psicológica de maneira análoga ao papel do instrumento no trabalho.
- Os instrumentos são elementos externos ao sujeito, voltados para fora dele, e sua função é provocar mudanças nos objetos, controlar processos da natureza. Os signos, por sua vez, também chamados por Vygotsky de “instrumentos psicológicos”, são orientados para o próprio sujeito, para dentro do indivíduo; dirigem-se ao controle de ações psicológicas, seja do próprio indivíduo, seja de outras pessoas. São ferramentas auxiliares nos processos psicológicos e não nas ações concretas, como os instrumentos.
- A memória mediada por signos é mais poderosa que a memória não mediada.
- São inúmeras as formas de utilizar os signos como instrumentos que auxiliam no desempenho de atividades psicológicas e melhoram nossas possibilidades de armazenamento de informações (lista de compras por escrito, mapa para encontrar um local, dar um nó no dedo para não esquecer um compromisso).
- O uso de mediadores aumentou a capacidade de atenção e de memória e, sobretudo, permitiu maior controle voluntário do sujeito sobre sua ação.
- Os processos de mediação também sofrem transformações ao longo do desenvolvimento do indivíduo. Justamente por constituírem funções psicológicas mais sofisticadas, os processos mediadores vão se construindo ao longo do desenvolvimento, não estando ainda presentes nas crianças.

OS SISTEMAS SIMBÓLICOS E O PROCESSO DE INTERNALIZAÇÃO

- Ao longo da evolução da espécie humana (desenvolvimento filogenético) e do desenvolvimento de cada indivíduo (desenvolvimento ontogenético), ocorrem duas mudanças qualitativas fundamentais no uso dos signos. Por um lado, a utilização de marcas externas vai se transformar em processos internos de mediação; esse mecanismo é chamado, por Vygotsky, de processo de internalização. Por outro lado, são desenvolvidos sistemas simbólicos, que organizam os signos em estruturas complexas e articuladas.
- Ao longo do processo de desenvolvimento, o indivíduo deixa de necessitar de marcas externa e passa a utilizar signos internos, isto é, representações mentais que substituem os objetos do mundo real. Os signos internalizados são, como as marcas exteriores, elementos que representam objetos, eventos situações.
- A própria idéia de que o homem é capaz de operar mentalmente sobre o mundo – isto é, fazer relações, planejar, comparar, lembrar – supõe um processo de representação mental. Temos conteúdos mentais que tomam o lugar dos objetos, as situações e dos eventos do mundo real.
- A capacidade de lidar com representações que substituem o próprio real é que possibilita ao homem liberta-se do espaço e do tempo presentes, fazer relações mentais na ausência das próprias coisas, imaginar, fazer planos e ter intenções. Essas possibilidades de operação mental não constituem uma relação direta com o mundo real fisicamente presente; a relação é mediada pelos signos internalizados que representam os elementos do mundo, libertando o homem da necessidade da interação concreta com os objetos do seu pensamento.
- Quando trabalhamos com os processos superiores que caracterizam o funcionamento psicológico tipicamente humano, as representações mentais da realidade exterior são, na verdade, os principais mediadores a serem considerados na relação do homem com o mundo. É justamente a origem dessas representações que Vygotsky está buscando quando nos remete à criação e o uso dos instrumentos e dos signos externos como mediadores da atividade humana.
- Ao longo da história da espécie humana – onde o surgimento do trabalho propicia o desenvolvimento da atividade coletiva, das relações sociais e do uso de instrumentos – as representações da realidade têm se articulado em sistemas simbólicos. Isto é, os signos não se mantêm como marcas externas isoladas, referentes a objetos avulsos, nem como símbolos usados por indivíduos particulares. Passam a ser compartilhados pelo conjunto de membros do grupo social, permitindo a comunicação entre os indivíduos e o aprimoramento da interação social.
- Os sistemas de representação da realidade – e a linguagem é o sistema simbólico básico de todos os grupos humanos – são, portanto, socialmente dados. É o grupo cultural onde o indivíduo se desenvolve que lhe fornece formas de perceber e organizar o real, as quais vão constituir os instrumentos psicológicos que fazem a mediação entre o indivíduo e o mundo. Enquanto mediadores entre o individuo e o mundo real, esses sistemas de representação da realidade consistem numa espécie de “filtro” por meio do qual o homem será capaz de ver o mundo e operar sobre ele.
- É a partir de sua experiência com o mundo e com o contato com as formas culturalmente determinadas de organização do real (e com os signos fornecidos pela cultura) que os indivíduos vão construir seu sistema de signos, o qual consistirá numa espécie de “código” para a decifração do mundo.
- Os grupos culturais em que as crianças nascem e se desenvolvem funcionam no sentido de produzir adultos que operam psicologicamente de uma maneira particular, de acordo com os modos culturalmente construídos de ordenar o real. A dimensão sociocultural do desenvolvimento humano não se refere apenas a um amplo cenário, um pano de fundo onde se desenrola a vida individual. Isto é, quando Vygotsky fala em cultura não está se reportando apenas a fatores abrangentes como o país onde o indivíduo vive, seu nível sócio-econômico, a profissão de seus pais. Está falando sim do grupo cultural como fornecendo ao indivíduo um ambiente estruturado, onde todos os elementos são carregados de significação. Toda vida humana está impregnada de significações e a influência do mundo social se dá por meio de processos que ocorrem em diversos níveis.
- Há uma multiplicidade de fatores que define qual é o mundo em que o indivíduo vai se desenvolver.
- A interação face a face entre indivíduos particulares desempenha um papel fundamental na construção do ser humano: é por meio da relação interpessoal concreta com outros homens que o indivíduo chegará a interiorizar as formas culturalmente estabelecidas de funcionamento psicológico. Portanto, a interação social, seja diretamente com outros membros da cultura, seja por meio dos diversos elementos do ambiente culturalmente estruturado, fornece a matéria-prima para o desenvolvimento psicológico do indivíduo.
- A cultura não é pensada como algo pronto, um sistema estático ao qual o indivíduo se submete, mas como uma espécie de “palco de negociações”, em que seus membros estão em um constante movimento de recriação e reinterpretação de informações, conceitos e significados. A vida social é um processo dinâmico, onde cada indivíduo é ativo e onde acontece a interação entre mundo cultural e mundo subjetivo de cada sujeito. Neste sentido, Vygotsky postula a interação entre vários planos históricos: a história da espécie (filogênese), a história do grupo cultural, a história do organismo individual da espécie (ontogênese) e a sequência singular de processos e experiências vividas por cada indivíduo.
- O processo pelo qual o indivíduo internaliza a matéria-prima fornecida pela cultura não é, pois, um processo de absorção passiva, mas de transformação, de síntese. Esse processo é, para Vygotsky, um dos principais mecanismos a serem compreendidos no estudo do ser humano. É como se, ao longo de seu desenvolvimento, o indivíduo, “tomasse posse” das formas de comportamento fornecidas pela cultura, num processo em que as atividades externas e as funções interpessoais transformam-se em atividades internas, intrapsicológicas.
- O processo de desenvolvimento do ser humano, marcado por sua inserção em determinado grupo cultural, se dá “de fora para dentro”. Primeiramente o indivíduo realiza ações externas, que são interpretadas pelas pessoas ao seu redor, de acordo com os significados culturalmente estabelecidos. A partir dessa interpretação é que será possível para o indivíduo atribuir significados a suas próprias ações e desenvolver processos psicológicos internos que podem ser interpretados por ele próprio a partir dos mecanismos estabelecidos pelo grupo cultural e compreendidos por meio dos códigos compartilhados pelos membros desse grupo.
- Todas as funções no desenvolvimento da criança aparecem duas vezes: primeiro, no nível social, e, depois, no nível individual; primeiro entre pessoas (interpsicológica), e, depois, no interior da criança (intrapsicológica).
- As origens das Funções Psicológicas Superiores devem ser buscadas, assim, nas relações sociais entre o indivíduo e os outros homens: para Vygotsky o fundamento do funcionamento psicológico tipicamente humano é social e, portanto, histórico. Os elementos mediadores na relação entre o homem e o mundo – instrumentos, signos e todos os elementos do ambiente humano carregados de significado cultural – são fornecidos pelas relações entre os homens. Os sistemas simbólicos, e particularmente a linguagem, exercem m papel fundamental na comunicação entre os indivíduos e no estabelecimento de significados compartilhados que permitem interpretações de objetos, eventos e situações do mundo real.


PENSAMENTO E LINGUAGEM

- Como a linguagem é o sistema simbólico básico de todos os grupos humanos, a questão do desenvolvimento da linguagem e suas relações com o pensamento ocupam lugar central na obra de Vygotsky.
- Vygotsky trabalha com duas funções básicas da linguagem. A principal função é a de intercâmbio social: é para se comunicar com seus semelhantes que o homem cria e utiliza os sistemas de linguagem. Essa função de comunicação com os outros é bem visível na criança que está começando a aprender a falar: ela não sabe ainda articular palavras, nem é capaz de compreender o significado preciso das palavras utilizadas pelos adultos, mas consegue comunicar seus desejos e seus estados emocionais aos outros através de sons, gestos e expressões. É a necessidade de comunicação que impulsiona, inicialmente, o desenvolvimento da linguagem.
- Para que a comunicação seja possível de forma sofisticada é necessário que sejam utilizados signos, compreensíveis por outras pessoas, que traduzam idéias, sentimentos, vontades, pensamentos, de forma bastante precisa.
- A segunda função da linguagem é a de pensamento generalizante. A linguagem ordena o real, agrupando todas as ocorrências de uma mesma classe de objetos, eventos, situações, sobre uma mesma categoria conceitual. É essa função de pensamento generalizante que torna a linguagem um instrumento de pensamento: a linguagem fornece os conceitos e as formas de organização do real que constituem a mediação entre o sujeito e o objeto de conhecimento. A compreensão das relações entre pensamento e linguagem é, pois, essencial para a compreensão do funcionamento psicológico do ser humano.

O DESENVOLVIMENTO DO PENSAMENTO E DA LINGUAGEM

- O pensamento e a linguagem têm origens diferentes e desenvolvem-se segundo trajetórias diferentes e independentes, antes que ocorra a estreita ligação entre esses dois fenômenos. Vygotsky trabalha com desenvolvimento da espécie humana e com o desenvolvimento do indivíduo, buscando compreender a origem e trajetória desses dois fenômenos.
- O trabalho é uma atividade que exige, por um lado, a utilização de instrumentos para a transformação da natureza e, por outro lado, o planejamento, a ação coletiva e, portanto, a comunicação social.

DESENVOLVIMENTO E APRENDIZADO

- Vygotsky não chegou a formular uma concepção estruturada do desenvolvimento humano, a partir da qual pudéssemos interpretar o processo de construção psicológica do nascimento até a fase adulta. Este autor também não nos oferece uma interpretação completa do percurso psicológico do ser humano; oferece-nos, isto sim, reflexões e dados de pesquisa sobre os vários aspectos de desenvolvimento.
- Vygotsky também enfatiza a importância dos processos de aprendizado. Para ele, desde o nascimento da criança, o aprendizado está relacionado ao desenvolvimento e é “um aspecto necessário e universal do processo de desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente organizadas e especificamente humanas”. Há um percurso de desenvolvimento, em parte definido pelo processo de maturação do organismo individual, pertencente à espécie humana, mas o aprendizado que possibilita o despertar de processos internos de desenvolvimento que, não fosse o contato do indivíduo com certo ambiente cultural, não ocorreriam.
- A concepção de que é o aprendizado que possibilita o despertar de processos internos dos indivíduos liga o desenvolvimento da pessoa a sua relação com o meio ambiente sócio-cultural em que vive e sua situação de organismo que não se desenvolve plenamente sem o suporte de outros indivíduos da sua espécie. E essa importância que Vygotsky dá ao papel do outro social no desenvolvimento dos indivíduos cristaliza-se na: formulação de um conceito específico dentro de sua teoria, essencial para a compreensão de suas idéias sobre a relação entre desenvolvimento e aprendizado: o conceito de zona de desenvolvimento proximal.

O CONCEITO DE ZONA DE DESENVOLVIMENTO PROXIMAL


- Nível de Desenvolvimento Real - Capacidade de realizar tarefas de forma independente.
- Nível de Desenvolvimento Potencial - Capacidade de desempenhar tarefas com a ajuda de adultos ou companheiros mais capazes.
- A possibilidade de alteração no desempenho de uma pessoa pela interferência de outra é fundamental na teoria de Vygotsky:
1º) Porque representa, de fato, um momento de desenvolvimento: não é qualquer indivíduo que pode, a partir da ajuda de outro, realizar qualquer tarefa. A capacidade de se beneficiar com uma colaboração de outra pessoa vai ocorrer num certo nível de desenvolvimento, mas não antes.
A idéia de nível de desenvolvimento potencial capta um momento do desenvolvimento que caracteriza não as etapas já alcançadas, já consolidadas, mas etapas posteriores, nas quais a interferência de outras pessoas afeta significativamente o resultado da ação individual.
2º) Porque atribui extrema importância a interação social no processo de construção das funções psicológica humanas. O desenvolvimento individual se dá num ambiente social determinado e a relação com o outro, nas esferas e níveis da atividade humana, é essencial para o processo de construção de ser psicológico individual.
- É a partir da postulação da existência desses dois níveis de desenvolvimento (real e potencial) que Vygotsky define a Zona de Desenvolvimento Proximal como a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sobre a orientação de um outro mais capaz.
- Zona de Desenvolvimento Proximal - caminho que o indivíduo vai percorrer para desenvolver funções que estão em processo de amadurecimento e que se tornarão funções consolidadas, estabelecidas no seu nível de desenvolvimento real. A Zona de Desenvolvimento Proximal é, pois, um domínio psicológico em constante transformação. Interferindo constantemente na Zona de Desenvolvimento Proximal das crianças, adultos e crianças mais experientes contribuem para movimentar os processos de desenvolvimento dos membros imaturos da cultura.

O PAPEL DA INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA

- Nas sociedades letradas a escola tem um papel central no desenvolvimento das pessoas.
- A implicação da concepção de Vygotsky para o ensino escolar é imediata. Se o aprendizado impulsiona o desenvolvimento, a escola tem um papel essencial na construção do ser psicológico adulto dos indivíduos que vivem em sociedades escolarizadas. Mas o desempenho desse papel só se dará adequadamente quando, conhecendo o nível de desenvolvimento dos alunos, a escola dirigir o ensino não para etapas intelectuais já alcançadas, mas sim para estágios de desenvolvimento ainda não incorporados pelos alunos, funcionando realmente como um motor de novas conquistas psicológicas.
- O processo de ensino e aprendizado na escola deve ser construído tomando como ponto de partida o nível de desenvolvimento real da criança (num dado momento e com relação a um determinado conteúdo a ser desenvolvido) e como ponto de chegada os objetivos estabelecidos pela escola, adequados à faixa etária e ao nível de conhecimento e habilidades de cada grupo de crianças. O percurso a ser seguido nesse processo estará balizado também pelas possibilidades das crianças, Isto é, pelo nível de desenvolvimento potencial.
- O professor tem o papel explícito de interferir na zona de desenvolvimento proximal de seus alunos, provocando avanços que não ocorreriam espontaneamente. “O único bom ensino, afirma Vygotsky, é aquele que se adianta ao desenvolvimento”.
***Alunos são heterogêneos.
***Professor é um mediador.
***Nas situações informais de aprendizado os sujeitos utilizam as interações sociais como forma privilegiadas de acesso à informação.
*** Qualquer modalidade de intervenção social, quando integrada num contexto realmente voltado para a promoção do aprendizado e do desenvolvimento, pode ser utilizada, de forma produtiva, na situação escolar.
- Ao enfatizar o papel da intervenção no desenvolvimento, Vygotsky aponta que o objetivo é trabalhar com a importância do meio cultural e das relações entre indivíduos na definição de um percurso de desenvolvimento da pessoa, e não propor uma pedagogia diretiva, autoritária. Este autor trabalha com a idéia de reconstrução, de reelaboração, por parte do indivíduo, dos significados que lhe são transmitidos pelo grupo cultural. A constante recriação da cultura por parte de cada um dos seus membros é a base do processo histórico, sempre em transformação, das sociedades humanas.
- Ligado, mas não restrito aos procedimentos escolares, o mecanismo da imitação não é uma mera cópia de um modelo. É a reconstrução individual daquilo que é observado nos outros. Essa reconstrução é balizada pelas possibilidades psicológicas da criança que realiza a imitação e constitui, para ela, criação de algo novo a partir do que observou do outro. A atividade imitativa não é mecânica, mas sim uma oportunidade de a criança realizar ações que estão além de suas próprias capacidades, o que contribuiria para o se desenvolvimento. Só é possível a imitação de ações que estão dentro da zona de desenvolvimento proximal do sujeito. A imitação pode ser utilizada em situações de ensino e aprendizagem como forma de permitir a elaboração de uma função psicológica no nível interpsíquico (coletivo, social) para que mais tarde essa função possa ser internalizada como atividade intrapsicológica ( interna ao próprio indivíduo).


BRINQUEDO E DESENVOLVIMENTO

- Considerado como domínio da atividade infantil o brinquedo tem claras relações com o desenvolvimento.
- O brinquedo é também uma atividade regida por regras.
- Em uma situação imaginária (“faz-de-conta”) a criança é levada a agir num mundo imaginário, onde a situação é definida pelo significado estabelecido pela brincadeira e não pelos elementos reais concretamente presentes.
- O brinquedo provê uma situação de transição entre a ação da criança com objetos concretos e suas ações com significado.
- São exatamente as regras da brincadeira que fazem com que a criança se comporte de forma mais avançada do que aquela habitual para a sua idade.
- O que na vida real é natural e passa desapercebido, na brincadeira torna-se regra e contribui para que a criança entenda o universo particular dos diversos papéis que desempenha.
- Tanto pela criação da situação imaginária, como pela definição de regras específicas, o brinquedo cria uma zona de desenvolvimento proximal na criança. Na brincadeira a criança comporta-se de forma mais avançada do que nas atividades de vida real e também aprende a separar objeto e significado.
- A promoção de atividades que favoreçam o envolvimento da criança em brincadeiras, principalmente aquelas que promovem a criação de situações imaginárias, tem nítida função pedagógica. A escola, e principalmente a educação infantil, pode se utilizar desse tipo de situação para atuar no desenvolvimento dos alunos.

Para saber +


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Bibliografia
OLIVEIRA, Marta Kohl de. VYGOTSKY – Aprendizado e Desenvolvimento Sócio-histórico. São Paulo: Scipione Ltda.: Vozes, 1993.

Documentário encontrado em Café Filosófico

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Jean Piaget

Teorias sobre a Origem e a Evolução do Conhecimento Humano

INATISMO - Conhecimento é pré - formado, Inato. Nasce com o sujeito.
Representantes: Konrad Lorenz e Noam Chomsky.
EMPIRISMO/BEHAVIORISMO - Conhecimento tem origem e evolui a partir das experiências que o sujeito vai acumulando.
- Levado ao extremo, o Empirismo se expressa no determinismo ambiental : o homem é produto do ambiente.
Representantes: Jonh Broadus Watson e Burrhus Frederic Skinner (comportamentalistas= Behaviorismo).
CONSTRUTIVISMO - Conhecimento resulta da interação, do sujeito com o ambiente.
Representantes: Jean Piaget, Henri Wallon, L.S. Vygotsky, A. N. Leontiev e A.R. Luria.


BIOGRAFIA

Nasceu em Neuchâtel, Suíça, em 09 de agosto de 1886.
Formação científica em biologia.
Especialista em psicologia evolutiva e epistemologia genética, filósofo e educador, com enorme produção na área de Educação.
Conhecido principalmente por organizar o desenvolvimento cognitivo em uma série de estágios.
Desde criança interessou-se por mecânica, fósseis e zoologia.
Enquanto terminava seus estudos secundários trabalhou como assistente voluntário no Laboratório do Museu de História Natural, de Neuchâtel, sob a direção de Paul Godet, especialista em malacologia.
Com a morte de Godet, em 1911, continuou trabalhando no laboratório e escreveu e publicou vários trabalhos.
Doutor em Ciências (1918) pela Universidade de Neuchâtel (Suíça). Estudou em laboratórios de psicologia e estagiou em uma clínica psiquiátrica (período que tomou contato com as obras de Freud e Jung).
Em 1919 ingressou na Sorbonne, onde estudou psicopatologia. Estagiou em um hospital psiquiátrico e estudou lógica. Trabalhou em laboratório de psicologia experimental, fez pesquisas com crianças deficientes mentais sobre a formação do número na criança.
Em 1923, assumiu a direção do Instituto Jean Jacques Rousseau, de Genebra, passando a estudar, sistematicamente, a inteligência.
Desde 1921, lecionou em várias universidades da Europa, além de proferir conferências nos USA, recebendo ali o título de doutor honoris causa. Também recebeu esse título da Universidade de Paris, onde lecionou.
Rio de Janeiro (1949): professor-conferencista, recebendo da Universidade do Brasil (hoje UFRJ) o título de doutor honoris causa.
Escreveu mais de 100 livros e artigos:
1.Seis Estudos de Psicologia;
2. A construção do Real na Criança;
3. A Epistemologia Genética;
4. O Desenvolvimento da Noção de Tempo na Criança;
5. Da Lógica da Criança à Lógica do Adolescente;
6. A Equilibração das Estruturas Cognitivas.
Morreu em Genebra em 16 de setembro de 1980, com 83 anos de idade.
Jean Piaget analisou por mais de 50 anos o psiquismo infantil e concluiu que cada criança constrói, ao longo do processo de desenvolvimento, o seu próprio modelo de mundo.

Principais Chaves do Desenvolvimento

- Própria ação do sujeito.
- O modo pelo qual esta ação do sujeito se converte em um processo de construção interna, isto é, de formação dentro da mente de uma estrutura em contínua expansão, que corresponde ao mundo exterior.
- Desde o princípio a criança exerce controle sobre a obtenção e organização de sua experiência do mundo exterior. As ações, inicialmente puras formas de exploração do mundo, aos poucos se integram em esquemas psíquicos ou modelos elaborados pela criança.
Esquema - padrão de comportamento ou ação que se desenvolve com uma certa organização e que consiste em um modo de abordar a realidade e conhecê-la.
Esquemas Simples (ex: reflexo de sucção).
Esquemas Complexos (ex: operações lógicas).
Os esquemas simples vão se organizando, integrando-se a outros e formando os esquemas complexos. As estruturas psicológicas desenvolvem-se gradualmente neste processo de integração com o ambiente e são compostas por uma série de esquemas integrados.
No Construtivismo os processos de desenvolvimento e aprendizagem são resultados da atividade do homem na interação com o meio ambiente. Piaget explica essa interação com o meio ambiente valendo-se de 3 conceitos (tomados da Biologia): Assimilação, Acomodação e Adaptação
Assimilação: incorporação de um NOVO (objeto ou idéia) ao que já é conhecido, ou seja, ao esquema que o sujeito já possui.
Acomodação: transformação que o organismo sofre para poder lidar com o ambiente. Diante do NOVO o sujeito modifica seus esquemas adquiridos anteriormente, tentando adaptar-se à nova situação.
EX:) Alimentação Assimilação - quando ingerimos o alimento e o modificamos conforme nossa experiência em lidar com os alimentos.
Acomodação - o organismo também é modificado para/ quando recebe o alimento (aumento da salivação, contrações musculares, etc.)
A criança é o próprio agente do seu desenvolvimento; os processos assimilativos gradualmente estendem seu domínio e a acomodação leva a modificações da atividade. Do equilíbrio dos processos de Assimilação e Acomodação advém uma Adaptação ao mundo cada vez mais adequada e uma consequente organização mental.
O desenvolvimento cognitivo, controlado por esses fatores, processa-se através de todas as atividades infantis:
- 0 a 2 anos : atividades físicas dirigidas a objetos e situações externas. À medida que aumentam as possibilidades da criança e ela domina a locomoção, depois a linguagem, as atividades externas desenvolvem uma dimensão interna importante. O que a criança vai explorando enquanto anda vai sendo representado mentalmente.
- 2 aos 6 anos: o processo continua através de todas as atividades infantis.
- Por volta dos 7 anos: surge o pensamento operatório. Inicialmente, as ações interiorizadas ainda se fundamentam na manipulação mental dos objetos e constituem as operações concretas.
- A partir dos 11/12 anos: com maior avanço surgem as operações abstratas (baseadas em raciocínio abstrato) e substituem as manipulações de objetos por uma lida com proposições verbais.
- Desde o começo, pois, construímos em nossa mente uma espécie de modelo interior do mundo que nos rodeia; como o modelo básico está em nossa mente, resta construí-lo, completá-lo e organizá-lo, à medida que se tem contato com os estímulos do meio.
- Piaget nos ajuda a compreender a sequência de desenvolvimento do modelo de mundo que uma criança vai construindo ao longo de cada período de sua vida; nos ajuda a compreender os “erros” cometidos pelas crianças, percebendo-os como resultados de uma maneira particular de interpretar a realidade, a partir de um modelo particular de mundo que se tem. É esse modelo particular de mundo da criança e não do professor que se tem de levar em conta quando se realiza o ensino. Além disso, a construção de novos modelos, mais evoluídos, só é possível graças à atividade do próprio aluno, que é agente de seu desenvolvimento.

Uma Proposta de Ensino Baseada no Construtivismo Piagetiano

- Piaget não pretendeu construir uma teoria pedagógica, embora seu método clínico pode sugerir uma atitude extensiva à prática pedagógica: OBSERVAÇÃO.
- Os professores têm preocupação e ansiedade em ensinar e não têm paciência suficiente para esperar que as crianças aprendam. Dificilmente aguardam as respostas das crianças, e com isso, perdem a oportunidade de acompanhar, através de respostas espontâneas, a estrutura de raciocínio de seus alunos (ansiosos para ensinar os professores não observam/avaliam as condições dos alunos para aprenderem).
- Modo clássico de intervenção dos professores: atividades dirigidas e controladas; explicar “como” fazer, resolver e “dizer” que está certo ou errado. Este tipo de intervenção contraria a tese da Psicogenética que consiste em atribuir um papel primordial à atividade do sujeito no processo de construção de seu próprio conhecimento (sujeito como agente ativo do seu desenvolvimento e aprendizagem).
- Educação fundamentada na teoria piagetiana: escolas com estratégias de ensinos que se baseiam na atividade do aprendiz. As crianças organizam suas atividades a partir de um objetivo mais ou menos preciso.
- Ao aprenderem verdades já estruturadas e apresentadas de maneira organizada os alunos perdem a oportunidade de realizarem suas próprias tentativas e estruturarem/construírem seu próprio conhecimento. O ideal seria o professor adaptar o material escolar em função do caminho intelectual do aluno.
- Outra tese piagetiana apresenta o desenvolvimento cognitivo como um processo sequencial marcado por etapas caracterizadas por estruturas mentais diferenciadas.
- A variabilidade na sequência do desenvolvimento pode ser observada em qualquer faixa etária e a observação atenta do professor consiste no recurso para oferecer à criança o tipo de ensino/atividades do qual ela realmente necessita.
- A falta de conhecimentos por parte dos professores em relação ao desenvolvimento os leva a cometer “erros/falhas” e propor situações-problemas em momentos inoportunos ou de forma inadequada. Outro fator que interfere é a necessidade do cumprimento dos programas de ensino.
- Proposta de uma Nova Forma de olhar o ensino:
- como está o aprendiz;
- o que fazer para que ele progrida, a partir do ponto em que ele está.
Aprender implica em COMPREENDER. O professor deve conhecer o processo de pensamento do aprendiz, ou seja, deve sondar o nível de desenvolvimento da criança antes de planejar o ensino (Avaliação Diagnóstica).
- O desenvolvimento cognitivo é um processo social. A interação tem papel importante no desenvolvimento das operações lógicas, pois influencia significativamente a visão do mundo do sujeito e lhe permite evoluir de uma perspectiva subjetiva para uma objetiva. Costuma-se, por este motivo, falar em co-operação para se fazer referência a este processo de desenvolvimento das operações no convívio social.
- Linguagem - é o recurso por meio do qual a criança representa o mundo que vai percebendo. Sua maneira de falar é condizente com sua estrutura mental, o que nos permite uma análise do desenvolvimento cognitivo através da fala.
- Solicitar à criança que apresente verbalmente seu raciocínio durante o trabalho e aceitar explicações adequadas ao seu nível de desenvolvimento.
- Linguagem e Raciocínio são complementares e se interinfluenciam.

O Desenvolvimento Psíquico na Perspectiva de Piaget

Déficits segundo Piaget:
a) Real
b) Circunstancial
c) Estrutural
d) Funcional
Cada estrutura cognitiva tem o seu próprio momento de aparecer. A interação adequada como o meio facilitará com que ela emerja e possa ser utilizada em sua plenitude. A perda desse momento pode ser “desastrosa”, pois uma estrutura mental, se não for exercitada no momento próprio, irá requerer, em etapa superior, maior esforço tanto do sujeito em desenvolvimento quanto de quem pretende facilitar/mediar este processo.


1. Aspectos e Estágios do Desenvolvimento Psíquico

Funções de Conhecimento: responsáveis pelo conhecimento que se tem do mundo e incluem:
- Pensamento lógico - desde os reflexos até o pensamento operatório.
- Organização da realidade - desde o estado de indiferenciação entre o EU e o MUNDO e a construção de conceitos.
Funções de Representação: incluem funções graças às quais representamos um significado qualquer (objeto, acontecimento, pessoa) usando um determinado significante (palavra, gesto, desenho).
+ imitação diferida, jogo, desenho, a linguagem e a imagem mental.
Funções Afetivas: o motor do desenvolvimento cognitivo.
Na relação com o Outro as funções passam por etapas desde a anomia (ausência de regras morais para limitar o que é permitido fazer) para a heteronomia (regras impostas pelo outro) até a autonomia moral.
O desenvolvimento dessas funções é marcado por períodos dotados de características bem definidas, as quais expõem uma estrutura qualitativamente diferente da qual a precede e das que a sucederão ao mesmo tempo em que preparam o indivíduo para o estágio seguinte.

2. O Desenvolvimento Cognitivo na Perspectiva de Piaget

A) Estágio Sensório-Motor
B) Estágio Objetivo-Simbólico (também denominado Pré-Operatório)
C) Estágio Operatório (também denominado Operacional Concreto)
D) Estágio das Operações Formais ( também denominado Operacional Abstrato)

A) Estágio Sensório-Motor

- Do nascimento até aproximadamente 2 anos (aparecimento da linguagem).
- O desenvolvimento se dá por meio de percepções, sentidos e movimentos, pelos quais o sujeito percebe o mundo.
- 1º momento do desenvolvimento lógico.
- Coordenação sensório-motora de ação baseada na evolução da percepção e da motricidade.
- Domínio dos reflexos à Aprendizagem.
- Nele se origina o comportamento inteligente (inteligência essencialmente prática).
Do Ponto de Vista do Desenvolvimento do Pensamento o Período Sensório-Motor é dividido em 6 subestágios:
1. Exercício Reflexo: atividade puramente reflexa (ex: sugar). Estende-se pelo 1o mês de vida.
2. Reações Circulares Primárias: formação dos primeiros hábitos (repetir o comportamento relativo ao próprio: movimento com as mãos, que foi casualmente emitido).
3. Coordenação de visão e preensão e Começo das reações circulares secundárias: a criança repete os comportamentos (reação circular) que produziram certo efeito e os faz intencionalmente. Há uma antecipação, embora limitada, do efeito de uma ação. Delineia-se, então, a diferença entre fins e meios, mas sem preliminares quando da aquisição de uma conduta nova.
Vai até aproximadamente os 8 meses.
4. Coordenação dos esquemas secundários: com utilização, em certos casos, de meios conhecidos para obtenção de um objetivo novo. Vai até aproximadamente os 18 meses.
5. Diferenciação dos esquemas de ação por reação circular terciária: variação das condições de exploração e tateamento dirigido e descoberta de meios novos (tenta outros meios para atingir seus objetivos; percebe que os esquemas do seu repertório são adequados para tingir todos os fins).
Com aproximadamente 18 meses a criança começa a pensar, a procurar o que quer e pegar sem auxílio. A criança já possui memória.
6. Início da interiorização dos esquemas e Solução de alguns problemas após a interrupção da ação e ocorrência de compreensão súbita: situação-problema - comportamento representativo àobservação à resposta. Vai até aproximadamente 2 anos.
Do Ponto de Vista da Organização da Realidade o Período Sensório-Motor apresenta as seguintes características:
- Coordenação dos movimentos e deslocamentos: inicialmente são centrados no próprio corpo. Descentralizam-se gradualmente e atingem um estágio em que a criança se percebe como um elemento entre outros e descobre o objeto permanente.
Ao esconder um brinquedo com o qual a criança está brincando:
1º) A criança procura, evidencia a compreensão da existência do brinquedo, mesmo fora do seu campo visual. A criança não é capaz de acompanhar os deslocamentos se o brinquedo for escondido em diferentes lugares. 4º subestágio / Aproximadamente dos 8 – 11 meses.
2º) A criança acompanha os deslocamentos sucessivos, desde que sejam perceptíveis = Grupo prático dos deslocamentos (capacidade de coordenar desvios, retornos de ações e outros movimentos). 5º subestágio / Aproximadamente 18 meses.
3º) A criança é capaz de encontrar o objeto escondido, mesmo quando há complexas combinações de esconderijo, incluindo até deslocamentos não perceptíveis = Generalização do grupo prático dos deslocamentos. A criança já domina o objeto permanente. 6º subestágio / Aproximadamente 2 anos.


B) Estágio Objetivo-Simbólico (também denominado Pré-Operatório)

- 2 anos até 6/7 anos.
- Desenvolvimento do Pensamento, Desenvolvimento da Linguagem e Desenvolvimento da Moral.
- Preparação e organização das operações concretas, tendo uma estrutura pré-operatória.
- A criança volta-se para realidade exterior; expande do subjetivo para o objetivo.
- Após os 18 meses, a criança começa a falar, usar jogos de faz-de-conta, imitar. Desta forma, instala-se o simbólico.
- 2 – 4 anos à instala-se a função simbólica e tem início a interiorização dos esquemas de ação em representações.
predomina a transdução (modelo de raciocínio primitivo, que se orienta do particular para o particular. À transdução relacionam-se os pré-conceitos ( são concretos e compostos de imagens) e as pré-relações.
O raciocínio transdutivo tende a justapor os elementos sem vinculá-los, mediante apelo à necessidade lógica ou causalidade física.
- fala egocêntrica.
- com aproximadamente 3 anos: SOLILÓQUIO. A criança fala em voz alta, mesmo sozinha. Assume vários personagens e brinca com amigos imaginários.
É uma aprendizagem e, portanto, necessita de treino. Localiza-se no Córtex Cerebral. Os estímulos estão presentes em nossas vidas e devem respeitar a maturação da criança (esse tempo é universal).

Aprendizagem:
- Estimulação
- Maturação
- Tempo

Fala (motora) - Lobo Frontal (Área de Broca).
Linguagem - Lobo Temporal Esquerdo (Área de Wernicke).
- Aprendizagem.
- Interpretação.

18 meses - 2 anos: Frases telegráficas com frases curtas, sem preposições e/ou conjunções. Início do uso do EU.
3 anos: Frases mais completas, com associação do EU/MEU.
Revolução Copérnica - a criança começa a criar independência, amplia seu campo de visão e ação è fatos responsáveis pela formação da personalidade da criança. Na descoberta dessa independência a criança torna-se EGOGÊNTRICA (Pensamento Egocêntrico).
Nesta fase é muito importante o adulto apresentar para a criança uma rotina, coerência nas atitudes dos pais e educadores e também permitir a criança que faça escolhas.
- Egocentrismo: 2 – 4 anos. É uma disposição afetivo-intelectual que se apresenta sempre que uma alteração da realidade social do sujeito não é acompanhada da capacidade de representar tal realidade. Não é egoísmo. A criança pensa que todos vêem o mundo como ela o vê. A criança se vê como o centro e a única estrutura de referência. Aparece também na adolescência e na velhice. Traz algumas manifestações características:
a) Animismo - é a tendência a atribuir vida (anima) a todos os seres, mesmo os inanimados.
b) Artificialismo - é a tendência a atribuir uma origem artesanal humana a todas as coisas (ex: a montanha foi feita por um homem grande que juntou muita terra).
c) Finalismo - é a tendência da criança a considerar que todos os seres e objetos têm uma finalidade, que é servi-la ( a cama é para ela dormir).
Egoísmo (desenvolvimento moral / social) é diferente do
Egocentrismo (desenvolvimento do EU / Individualidade)
- 4 – 5 1/2 anos - Aparecem as organizações representativas, fundadas seja sobre configurações estáticas, seja sobre assimilação à própria ação.
- Fase dos “porquês”.
- As primeiras estruturas representativas têm um caráter de dualidade dos estados e das transformações. Enquanto os estados são pensados como configurações estáticas (é o caso do papel da coleção de figurinha quando a criança forma classes), as transformações são assimiladas às ações, e a criança tende a não percebê-las.
- Aos 4 anos a criança começa a contar história, embora ainda não tenha seqüência lógico-temporal. Começa também a conjugar os verbos (Pensamento Verbal).
- A partir do 4 anos domina o raciocínio intuitivo: bastante rápido e ainda pré-lógico; fundamenta-se exclusivamente na percepção. A criança acredita numa constância perceptual (acredita no que ela vê).
A criança adquire um modo de lidar com muitos problemas de integração, de diferentes pontos de vista, e com informações de diferentes fontes.
A criança desconhece a reversibilidade e a conservação. Por isto, não é ainda uma lógica, mas uma semilógica, e, a falta de operações inversas, não tem uma estrutura operativa. A criança realiza operações em suas imagens mentais – considera a imagem mental em toda sua concretividade e depois organiza mentalmente, a fim de conseguir informações novas. Tudo se passa como se a imagem mental seguisse as leis que governam o objeto real, mas não pudesse formular conceitualmente tais leis e, assim, ver o problema através de uma forma inteiramente lógica, a fim de chegar a uma resposta.
- 5 – 7 anos: a criança descobre um série de “regras e estratégias” gerais abstratas, imensamente poderosas, para examinar e interagir com o mundo (operações concretas).
- 5 1/2 – 7 anos - Aparecem as regulações representativas articuladas.
- Fase intermediária entre a não-conservação e a conservação (quando adiciono algum elemento em algo, modifico-o).
- Marca o início das ligações entre estados e transformações, tornando possível pensá-las sob forma semi-reversível (a criança é capaz de acompanhar o movimento de transformar a água em gelo e admitir que seja possível voltá-la à forma anterior).
- O pensamento representacional, graças a sua capacidade simbólica, apreende, simultaneamente, numa síntese interna, única, uma série de fatos. Este pensamento pode refletir sobre a organização de seus próprios atos. É intrínseca a ela a faculdade de ser contemplativo da ação em lugar de ser meramente ativo.
- Outra característica do período pré-operacional é sua capacidade para superar o presente imediato, que lhe possibilita, com o tempo, estender seu alcance muito além dos atos presentes, concretos do sujeito e dos objetos presentes, concretos do ambiente.
- Operações: referem-se especialmente a esquemas internos como reversibilidade, adição, subtração, divisão, ordenação serial.
- Incapacidade de Descontração: O pensamento pré-operatório tende a centrar a atenção num só traço mais saliente do objeto de seu raciocínio, em detrimento dos demais aspectos importantes. A criança é incapaz de descentrar, isto é, de tomar em consideração aspectos que poderiam equilibrar e compensar os efeitos distorcedores do raciocínio, que se fixa apenas num aspecto particular da realidade.
- Estados X Transformações: A criança tende a concentrar sua atenção nos aspectos ou configurações sucessivos de uma coisa, mais do que nas transformações através das quais um estado se transforma em outro. É por este fato que dizemos que o pensamento pré-operacional é estático, imóvel, pode concentrar-se, de maneira esporádica e impressionista, nesta ou naquela condição momentânea, estática, mas não liga de modo adequado uma sucessão de condições numa totalidade integrada, levando em consideração as transformações que as unificam e as fazem logicamente coerentes.
- Ação: O pensamento pré-operacional desenvolve-se a partir de imagens concretas e estáticas da realidade, e não com sinais abstratos. Por isso, as representações da criança, tanto em sua forma quanto em sua operação, são muito mais próximas das ações manifestas que as representações de crianças maiores. A criança, em lugar de reorganizar, esquematizar, dar nova forma aos fatos, tende a imprimir em sua mente as sucessões de fatos da realidade tal como faria na conduta manifesta. Uma das formas assumidas por esse pensamento concreto é o realismo.
- Irreversibilidade: O pensamento pré-operacional, lento e muito concreto, não é reversível, pois não faz mais do que repetir aspectos irreversíveis da realidade.
- Brinca em grupo.
- Linguagem = Diálogo ( uso do Nós).
- Começa a escrever.
- A criança percebe / compreende que os elementos podem pertencer a mais de uma categoria ao mesmo tempo.
- Desenvolvimento Moral: há uma ambiguidade entre VIOLÊNCIA (é negativa e aprendida socialmente) e AGRESSIVIDADE (é “positiva”. A pessoa não se acomoda. É importante para o desenvolvimento moral).

C) Estágio Operatório (também denominado Operacional Concreto)

- 7 aos 11/12 anos.
- Muda a forma pela qual a criança aborda o mundo.
- As ações, que implicam em manipulação e contato direto com o real, são interiorizadas e passam a constituir as operações. Estas operações são ações interiorizadas (conhecer o real implica em pensar sobre ele) agrupadas em sistemas coerentes e reversíveis (pode-se anular uma ação e voltar ao ponto de partida).
- Reconstrução: requer a passagem de um estado inicial em que tudo está centrado no CORPO e na ação do sujeito a um estado de descentração que implica em relação objetiva com acontecimentos, objetos e pessoa. Para se chegar às operações o sujeito se baseia num universo físico e também em um universo interindividual e social. A criança elabora seu conhecimento do mundo levando em conta os sujeitos com os quais convive e que são ao mesmo tempo exteriores análogos ao EU.
- Cooperação: que emerge das relações entre iguais é indispensável à objetividade, coerência interna e universalidade das estruturas operatórias.
- De acordo com Piaget, as operações lógicas têm como modelo as Operações Lógico-Matemáticas e se organizam como estruturas mentais. Por se assemelharem à estrutura matemática do grupo, ele as denomina agrupamentos.
- 1º Subestágio de Operações Concretas - Classificação
(+- 7 aos +-9 anos) -  Seriação
- 2º Subestágio de Operações Concretas - Compensação Simples
( +- 9 aos +- 11/12 anos)
- Há uma hierarquia, com uma complexidade crescente. A ocorrência de uma depende sempre da que a antecede.


- Operações:

- constituem em transformações reversíveis e tal reversibilidade pode constituir em inversões ou em reciprocidade.
- a criança compreende estas reversibilidades sem, contudo, coordená-las.
- baseiam-se diretamente nos objetos e não ainda em hipóteses enunciadas verbalmente.
- são de duas ordens ( há uma estreita relação entre as duas):
a) Operações Lógico-Matemática - versam sobre semelhanças (classes e relações simétricas), diferenças (relações assimétricas) ou ambas ao mesmo tempo (números). Reúnem os objetos em classes, ordená-los, multiplicá-los, mas não se ocupam do objeto em sua composição inteira.
b) Operações Infralógicas - são formadoras da noção do objeto como tal, por oposição ao conjunto de objetos. Dizem respeito às conservações físicas (conservação da quantidade de matéria, de peso e de volume) e à constituição do espaço (conservação de comprimento, superfície, perímetro, horizontais, verticais, etc.). Resultam na construção de variantes físicas e espaciais.

O Desenvolvimento das Operações Infralógicas

- Transformação Operatória: não modifica tudo ao mesmo tempo. Há sempre um invariante (Segundo Piaget: noção ou esquema de conservação).
*** Noção de Conservação se constituem paralelamente à elaboração das estruturas Lógico-Matemáticas de classes, relações e números. Etapas de Não-Conservação, Semi-Conservação e Conservação.
Conservações Físicas:
1) Conservação de Quantidade: 7 aos 9 anos (identidade simples ou aditiva; reversibilidade por inversão; compensação ou reversibilidade por reciprocidade de relações).
2) Conservação de Peso: 9/10 anos.
3) Conservação de Volume: é a última a se instalar por volta dos 11 anos.
Conservações Espaciais:
1) Conservação de Comprimento: supõe a noção de distância e constituição do espaço que contém os objetos.
2) Conservação da Superfície.
3) Conservação do Volume Espacial. Etapas: capacidade de dissocia altura e volume; de 7 aos 9 anos a criança vai gradualmente colocando em relação as três dimensões (forma, altura e volume).

O Desenvolvimento das Operações Lógicas

As Operações Lógicas de Classificação, Seriação e Compensação emergem no Período Operatório (ou Operacional Concreto).
a) Classificação – consiste na capacidade de separar objetos, pessoas, fatos ou idéias em classes ou grupos, tendo por critério uma ou várias características comuns. É um agrupamento básico, cujas origens podem ser encontradas nas assimilações próprias dos esquemas sensório-motor. Etapas:
1. Coleção de Figuras: são reunidos os objetos semelhantes, mas justapondo-os espacialmente em fileiras, círculos, quadrados, de tal modo que a coleção forma uma figura no espaço que sirva de expressão perceptiva ou acompanhada da imagem de “extensão” da classe.
2. Coleções Não-Figurais: os objetos são reunidos em pequenos conjuntos, sem forma espacial, e podem diferenciar-se em subconjuntos.
3. Classificação Operatória: conseguida +- aos 8 anos. Caracteriza-se pelo encaixe de classes de extensão, o que não ocorria às coleções não-figurais ou inclusão de classes.
b) Seriação – ordenar os elementos segundo as grandezas crescentes ou decrescentes. É alcançada +- aos 7 anos e dela derivam progressos ulteriores:
1. Correspondências Seriais: fazer corresponder a um conjunto de objetos de tamanhos diferentes, seriando-os e fazendo corresponder termo a termo.
2. Seriação de duas dimensões.
c) Compensação: +- 9 aos 11/12 anos. Raciocínio que tenta restabelecer o equilíbrio de um sistema modificando uma variável do próprio sistema ou de um sistema diferente.


O Desenvolvimento de Conceitos Matemáticos

Os Conceitos Matemáticos de número, tempo e espaço e os conceitos combinados de espaço, tempo e velocidade desenvolvem-se em estreita relação com as operações lógicas e infralógicas, e se interinfluenciam.
Número - a formação do conceito de número efetua-se em estreita conexão com a conservação numérica e com as operações lógicas de classificação e seriação. Aprender a contar verbalmente não significa o domínio do conceito de número. Só se poderá falar em números operatórios quando estiver constituindo a conservação dos conjuntos numéricos independente dos arranjos espaciais. O conceito aritmético de número depende:
- da formação da noção de unidade.
- os elementos se tornam classificáveis segundo as inclusões de classes.
Espaço: a noção de espaço é fundamentada em estruturas em estruturas operatórias que se baseiam em objetos contínuos, nas suas vizinhanças e separações. São as estruturas infralógicas.
Medida Espacial é uma operação que se constitui em estreito isomorfismo com a noção de número, mas independe dela. A medida se inicia com a divisão do contínuo em classes; em seguida, para que se use a unidade, é preciso que uma das partes seja aplicada sucessivamente sobre o todo por deslocamento ordenado e isto corresponde a uma seriação. O desenvolvimento das operações espaciais na criança apresenta uma seqüência teórica: à Estruturas topológica de divisão de ordem (vizinhança, coordenação de vizinhança em ordem linear e depois bi e tridimensional) constituem um funcionamento geral que precede as estruturas projetivas (pontual, coordenação de ponto de vista) e as estruturas métricas (deslocamentos, medidas de duas/três dimensões em função de um sistema de referências ou coordenadas naturais).
Tempo: a noção de tempo repousa sobre três espécies d operações:
- Seriação de acontecimentos que constitui a ordem de sucessão temporal.
- Encaixe dos intervalos entre os acontecimentos pontuais, fonte da duração.
- Métrica temporal, isoforma à métrica espacial.
Velocidade: a noção de velocidade não principia em sua forma métrica (velocidade = espaço + tempo) antes dos 10/11 anos. Tem inicialmente um caráter ordinal. Apresenta a seguinte seqüência de desenvolvimento:
a) pré-operatório – a criança só considera os pontos de chegada.
b) a criança estrutura operacionalmente as ultrapassagens antecipadamente tanto quanto as contatadas.
c) a criança toma em consideração a grandeza crescente ou decrescente dos intervalos (nível hiperordinal).
d) a criança estabelece relações entre os espaços percorridos e o tempo gasto.

D) Estágio das Operações Formais ( também denominado Operacional Abstrato)

- 11/12 a 14/15 anos.
- O adolescente, ao tomar em consideração um problema, é capaz de prever todas as relações que poderiam ser válidas e logo procura determinar, por experimentação e análise, qual dessas relações possíveis tem validez real.
- O adolescente não se limita a organizar o que lhe chega através dos sentidos; tem a capacidade potencial de imaginar o que poderia estar ali.
- A descentração que se realiza na pré-adolescência, liberando o pensamento infantil do concreto, em proveito dos interesses orientados para o abstrato e o futuro, implica algumas outras características:
a) a estratégia que trata de determinar a realidade no contexto da possibilidade tem caráter fundamentalmente hipotético-dedutivo. Descobrir o real em meio ao possível supõe que se possa considerar o possível como um conjunto de hipóteses que devem ser confirmadas ou refutadas sucessivamente.
b) os dados são enunciados ou proposições que contêm esses dados. Pensamento formal é, sobretudo, pensamento proposicional. Tomam-se os resultados das operações concretas (ex: classificação e seriação).
As operações formais são, na realidade, operações realizadas sobre o resultado de operações concretas anteriores. Piaget denomina-as “Operações de 2º Grau” ou “Operações a 2ª Potência”.
c) o adolescente isola de modo sistemático todas as variáveis individuais, submetendo-as a uma análise combinatória, método que assegura a realização de um inventário completo do possível.
IMPORTANTE: Todos os traços do pensamento formal unem-se para transformá-lo em instrumento do raciocínio científico. O adolescente é capaz de achar a solução correta para um genuíno problema de descoberta científica. Os instrumentos adequados lhe são proporcionados pela atitude hipotético-dedutiva, pelo método combinatório e pelos demais atributos do pensamento formal, que lhe permitem isolar as variáveis que poderiam ser causais, mantendo um fator constante, a fim de determinar a ação causal do outro. Assim, o adolescente é capaz de imaginar as diversas transformações possíveis a que se podem submeter os dados para pô-los à prova empiricamente, e também é capaz de interpretar de maneira lógicamente correta os resultados de provas empíricas.

Combinatória

O adolescente é capaz de construir quaisquer classes e relações reunindo os elementos (1 a 1; 2 a 2; 3 a 3......).
O adolescente é capaz de combinar objetos entre si, fatos, idéias ou proposições, raciocinando, em cada caso, sobre a realidade dada, não mais reduzindo-a aos aspectos limitados e concretos, mas sim em função de todas as combinações possíveis (ou certos número delas). Isso realça os poderes dedutivos da inteligência e esclarece o conceito da combinatória.

Para saber +

Download Jean Piaget

Referências:
GOULART, Iris Barbosa. PIAGET – Experiências Básicas para Utilização pelo Professor. Petrópolis: Vozes, 1996.
Documentário encontrado em Café Filosófico





sábado, 14 de agosto de 2010

Ética e Responsabilidade Social - 2º Sem.

CIDADANIA NA PASSAGEM DO SÉCULO XXI PARA O SECÚLO XX
Sidnei Ferreira de Vares

1. Uma aproximação com o conceito de cidadania


· O conceito de cidadania: remonta a Grécia Antiga, mais precisamente à Cidade-Estado de Atenas, onde era considerado cidadão aquele que, sendo homem e livre, tivesse nascido nos limítrofes da cidade, tendo, por isso, direito a participar das discussões e decisões políticas que envolviam a Pólis;
· Tratava-se de uma cidadania direta e participativa, onde todos aqueles considerados cidadãos podiam usufruir de seus benefícios;
· Em Roma, o título de cidadão romano tinha um peso enorme, pois, todos aqueles que o possuíam tinham seus direitos civis garantidos;
· Numa acepção moderna, a cidadania passa a se desenvolver na Inglaterra durante o século XVII, mas alcança seu máximo grau de consolidação com a Revolução Francesa do século XVIII e com a Independência Americana;
· O Iluminismo, sem sombra de dúvidas, teve papel decisivo na construção e difusão desse conceito-prática;
· Como aponta (T.H.verificar) Marshall, a cidadania, inclui várias dimensões. Uma cidadania é considerada plena quando combina liberdade, participação política e igualdade para todos, embora esse seja um ideal difícil de alcançar;
· Como propões Marshall, podemos falar em pelo menos três dimensões da cidadania, que abarca, a saber: (a) os direitos civis, fundamentais à vida, à liberdade, à garantia de ir e vir, à manifestação do livre-pensamento; (b) os direitos políticos, que se referem a participação no jogo político pelas vias partidárias e organizadas; (c) e os direitos sociais, ou seja, aqueles direitos que remetem à igualdade de oportunidades e às condições mínimas para uma existência digna, diminuindo as desigualdades sociais e garantindo o bem-estar de todos;
· Os direitos civis garantem a vida em sociedade, os direitos políticos a participação política e os direitos sociais;
· Evidentemente que se soma a isso a necessidade de educar o povo, pois sem educação o exercício da cidadania fica comprometido;
· Se analisarmos a proposta de Marshall, verificaremos que o autor não toma essas dimensões somente do ponto de vista cronológico, mas também do ponto de vista lógico;
· É necessário primeiro conquistar direitos civis, para obter os direitos políticos e, assim, poder lutar para adquirir os direitos sociais. Foi assim na Inglaterra e de certo modo na França;
· Todavia, em alguns países tal processo escapou a lógica proposta por Marshall, o que não nos permite dizer que outras lógicas não sejam possíveis na construção histórica da cidadania;
· Mas de certo modo, a lógica proposta pelo autor mostra-se coerente e, uma vez desviada, pode implicar em atraso ou aberrações na construção da cidadania;
· Diante dessa constatação cumpre alertar que o Brasil enquadra-se nesse segundo caso, ou seja, a lógica de construção de nossa cidadania não passa pela lógica proposta por Marshall;

2. A construção histórica da cidadania no Brasil


· Escolhemos analisar o conceito de cidadania tendo como pano-de-fundo a passagem do século XIX ara o século XX, por alguns motivos especiais;
· Em primeiro o século XIX traz uma curiosidade: ele reúne as três fases que compõem nosso processo histórico;
· Se aceitarmos que o período colonial se estende até 1808, ano da chegada da família real portuguesa ao Brasil, que a partir de 1822 temos um país independente e monárquico em sua forma política até 1889, ano do advento republicano, nos convenceremos de que o século XIX reúne as três fases de nossa formação histórica;
· Assim sendo, o século XIX parece condensar nossa história e é a partir desse recorte temporal que analisaremos o conceito de cidadania no Brasil;

2.1 Período Colonial

· Em primeiro lugar, cumpre dizer que no caso brasileiro tal conceito demorou tanto para despontar e quanto para se desenvolver e certamente ainda não se consolidou plenamente;
· Durante o chamado período colonial, o mais longo período de nossa história, a noção de cidadania inexistia. A própria estrutura política colonial, baseada na grande propriedade e no sistema escravista, impedia seu desenvolvimento;
· O Brasil estava reduzido à condição de colônia de exploração, cuja metrópole não se incomodaria em fornecer os pressupostos básicos para o desenvolvimento da cidadania. Tratava-se de um país agrário, marcado pelo isolamento entre as cidades, pela ausência de um povo politizado e principalmente com um grande número de escravos;
· Os escravos, com se sabe, não eram considerados cidadãos, pois não tinham qualquer tipo de direito, nem mesmo o da própria integridade física;
· Mesmo considerando a existência de uma fração intermediária entre os escravos e os senhores, a população pobre e livre, esta também não dispunha de condições para o exercício dos direitos cívicos. Sem poderio econômico e educação, dependiam dos grandes proprietários para morar e trabalhar;
· Até os grandes senhores não podem ser considerados como dotados de cidadania. Eram, sem dúvidas, livres, votavam e eram votados na condição de “homens bons” da colônia, mas lhes faltava qualquer sentido de cidadania. Enquadravam-se na estrutura sustentada pela coroa portuguesa ocupando cargos no estado sem maiores questionamentos;
· Seria um erro supor que durante o período colonial não houve manifestações sociais contra a colônia, inclusive no sentido da independência do país. Todavia, cumpre lembrar que essas manifestações foram pontuais, ou melhor, regionais, e traziam consigo muito mais uma carga de patriotismo do que cidadania;
· Alguns movimentos como a resistência dos escravos no quilombo dos palmares e a inconfidência mineira, podem ser vistos como movimentos que apresentam o germe na luta pela cidadania, mas ainda pouco desenvolvido;
· A maior parte das revoltas durante o período colonial tem características classistas ou regionais que não nos permite entendê-las como portadoras de um discurso cidadão;

2.2 Período Monárquico


· A chegada da família real ao Brasil trouxe grandes transformações para a colônia. Não só o Rio de Janeiro, lugar que abrigou a corte portuguesa, mas o Brasil todo sentiria as mudanças ocasionadas pela presença da corte;
· Os benefícios e liberdades, ainda que diminutas, conquistadas durante a permanência da coroa portuguesa, explicam o desencadeamento do processo que levou à independência brasileira;
· O fim do pacto colonial e a elevação do Brasil a condição de Reino Unido deu perspectivas diferentes às elites brasileiras, embora não houvesse por parte destes, desejos mais profundos de transformação política;
· A independência do Brasil, proclamada em 1822 não se configurou, diferentemente dos países Américo - hispânicos, num processo truculento;
· Diferentemente de nossos vizinhos, nossa independência foi bastante tranqüila, um acordo de cavalheiros, que envolveu: a coroa portuguesa, que desejava em manter algum tipo de relação com o Brasil; a coroa britânica, maior interessada no comércio com o novo país que estava para surgir; e as elites tupiniquins, preocupadas com fragmentação do território brasileiro;
· Enquanto os processos de independência na América Espanhola desembocaram em repúblicas, nossa independência teve como resultado uma monarquia, mantendo a Casa de Bragança no controle da mais nova nação independente do continente, até ali chamada de “flor exótica” da América;
· E isso foi bom? Ora, o fato de termos uma independência tranqüila não pode ser considerado ruim, mas é também preciso afirmar que todo processo de luta política apresenta-se como excelente espaço de aprendizagem, inclusive no que tange a conquista de direitos civis;
· Ademais, nossa independência não pode ser vista como uma ruptura com o cenário colonial, principalmente porque o sistema escravista e fundiário foi herdado pela monarquia. Em outras palavras, as relações sociais e políticas pouco se alteraram;
· É bem verdade que politicamente tornamo-nos uma nação livre, mas essa condição não alterou a vida da maior parte da população, ainda submetida a um conjunto de relações pouco voltado para participação política;
· A constituição de 1824, embora possa ser considerada bastante liberal pra época, na medida em que baseava na separação dos poderes executivo, legislativo e judiciário, contou com uma anomalia, em parte resultado da insistência de D. Pedro I: o poder moderador. Tratava-se de um poder acima dos demais poderes;
· Pela constituição de 1824, o Imperador tinha poder de dissolver a câmara, nomear senadores, sancionar ou vetar atos do legislativo;
· É verdade que a monarquia propiciou uma ampla participação dos súditos nas eleições, através de uma configuração de caráter censitário, que separava os “votantes” dos “eleitores”. A estrutura eleitoral estava organizada em dois turnos no qual os votantes, homens maiores de 25 anos e livres com renda acima de 100 mil-réis, escolhiam os eleitores, que deveriam ter renda superior a 200 mil-réis e estes, por sua vez, votavam e escolhiam entre os candidatos formando uma lista tríplice, da qual o Imperador escolhia o nome que lhe agradava;
· Todavia, essa participação não se convertia em sentimento de cidadania, na medida em que a população que votava era a mesma despreparada dos tempos da colônia, ficando a mercê dos grandes proprietários;
· Seja pela violência, fidelidade ou mesmo pela comercialização dos votos (principalmente nas capitais), o ato de votar não se converteu em participação efetiva e articulada;
· Com as modificações eleitorais no ao de 1881, que acabaram com as eleições em dois turnos e com os chamados “votantes”, dificultaram a participação do povo no processo eleitoral, elitizando o direito ao voto na monarquia e diminuindo o eleitorado em 90%
· Em 66 anos de monarquia, a participação política da população foi ampla, porém, controlada. Em parte, isso se explica porque as condições coloniais como o escravismo, a ausência de educação popular e a grande propriedade não tinham se esgotado com o período colonial;
· Com a Proclamação da república esperava-se que a cidadania enfim pudesse emplacar, afinal, alguns projetos republicanos pareciam apontar para esse sentido, como é o caso do projeto dos jacobinos. Todavia, liberais e positivistas tratariam de reduzir as chances daqueles;
· A abolição foi a única inovação política nessa transição que, embora tenha sido uma grande conquista para a população negra, não se converteu na aquisição de direitos civis. A passagem da condição de escravo a de cidadão foi muito mais semântica do que política, dada as condições paupérrimas que os ex-escravos foram submetidos;

3. O Período Republicano

· A Proclamação da República só pode ser entendida dentro de certas circunstâncias políticas, econômicas e sociais, iniciadas, pelo menos, desde 1870 com o fim da Guerra do Paraguai;
· Sem tempo, porém de aprofundarmos esses fatores, cumpre ao menos informar que o capitalismo se expandia do centro do sistema (Europa) e atingia igualmente a periferia, no qual se enquadrava o Brasil e a Proclamação da república foi resultado desse processo;
· A mentalidade do progresso gradualmente ganhava forma nos grandes centros urbanos brasileiros. Todavia, colidia com o marasmo e a lentidão do interior do país;
· A percepção do tempo diferia nessas duas realidades: a urbana e a rural. A sensação linear do tempo nas cidades se contrapunha a sensação circular do tempo nos rincões do país;
· Os grandes centros com Rio de Janeiro e São Paulo recebiam levas de imigrantes e uma industrialização crescente. Os interiores, por sua vez, ainda arraigados às tradições regionais, espreitavam com desconfiança a demoníaca República que se instalou em 1889;
· Euclides da Cunha soube como ninguém captar esses dois “brasis”: o do “litoral” e o do “interior” como expôs em Os Sertões com grande sensibilidade analítica;
· A República que apareceu na manhã de 15 de novembro, segundo alguns comentadores da época deixando o povo “bestializado”, não pouparia agora o país das inovações, em sua maioria importadas, tornando grandes centros brasileiros em estrangeiros dentro de seu próprio país, marcado pelos “rudes patrícios do interior” e os separando por séculos;
· A mentalidade do progresso se lançava contra o que considerava “atraso”, os resquícios do período monárquico, pois a República era a própria novidade em pessoa;
· Uma série de reformas, projetos de urbanização e novas tecnologias foram introduzidos nos grandes centros alterando o ritmo de vida da população urbana;
· Mas esse ideal progressista, não seria capaz de ampliar a participação política, os direitos civis e a seguridade social dos cidadãos;
· A primeira Constituição Republicana, promulgada 1891, ainda que de natureza distinta da constituição de 1824, principalmente pelo federalismo, não foi capaz de implementar a cidadania no regime nascente;
· Se o voto censitário e o centralismo foram abolidos, a restrição aos analfabetos, herança da reforma de 1881, foi mantida e tornou-se um empecilho a uma população majoritariamente sem instrução, mesmo nos grandes centros como São Paulo e Rio de Janeiro;
· Ademais, a herança da grande propriedade sobreviveu ao advento republicano e os velhos/novos “donos do poder” logo utilizariam a nova constituição para garantir seus privilégios, reforçando seu poder local dentro de um sistema de manipulação política;
· A violência e a intimidação, somada a baixa renda e instrução da população tornaram-se a própria negação da cidadania;
· Afinal, as transformações políticas ocorridas durante a segunda metade do século XIX se deram de cima para baixo, excluindo o povo. Agora, o povo permanecia excluído, pois, em essência, era o mesmo do período anterior, sem contar, contudo, com a proteção do monarca;
· A República Oligárquica instaurou uma lógica da opressão baseada na violência e manipulação através de mecanismos como o “voto de cabresto”, ”o voto de bico-de-pena”, ou seja, um jogo de cartas marcadas que camuflou um dos mais cruéis períodos da nossa história, só superado depois de 1945;
· Podemos inferir que a República, embora fosse uma ruptura política com o Império, oportunizou aos grandes latifundiários se instalarem no poder e dele usufruir sem qualquer preocupação com a promoção da cidadania;
· Voltando a reflexão de Marshall, podemos afirmar que a lógica da cidadania no Brasil foi outra. Os direitos civis e sociais foram negligenciados pelo menos até 1930;
· E embora os direitos políticos tivessem sido conquistados a partir da independência em 1822, o povo ficou impossibilitado de usufruir seus direitos políticos em virtude dos mecanismos de opressão que as elites fundiárias montaram a partir do império, dando continuidade durante a República.

Para saber mais: CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. 4ª Ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.